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Sistema Nacional do Patrimônio Cultural: Caminhos e Desafios


Allan Carlos Moreira Magalhães, Doutor em Direito, Professor da Universidade do Estado do Amazonas, Articulista do Instituto Brasileiro de Direitos Culturais (IBDCult), autor do livro “Patrimônio cultural, democracia e federalismo” e coautor do livro “É disso que o povo gosta: o patrimônio cultural no cotidiano da comunidade”    



Foto do Autor (acervo pessoal) - Cerimônia de entrega do título de patrimônio cultural brasileiro aos Bois de Manaus (Complexo Cultural do Boi-Bumbá do Médio Amazonas e Parintins)
Foto do Autor (acervo pessoal) - Cerimônia de entrega do título de patrimônio cultural brasileiro aos Bois de Manaus (Complexo Cultural do Boi-Bumbá do Médio Amazonas e Parintins)

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional está executando o projeto “Andanças do Patrimônio” com o propósito de construir de forma participativa o Sistema Nacional do Patrimônio Cultural. O projeto faz um convite aberto à participação popular de toda a sociedade, mas, em particular, aos detentores, fazedores e trabalhadores do patrimônio para construírem juntos as diretrizes e os principais pontos da agenda de políticas públicas patrimoniais. 


O projeto pretende andar por todos os Estados da federação e o Distrito Federal e, para direcionar e uniformizar as atividades, elaborou um Caderno Metodológico [1] estabelecendo o caminho (passo a passo) a ser trilhado pelos organizadores (Superintendências do IPHAN nos Estados).   Neste Caderno destaca-se para as oficinas a expectativa e o desejo da ampla participação de representantes da sociedade civil e do poder público, bem como que ela reflita a diversidade e a transversalidade, contemplando diferentes territórios, diversidade étnica, racial, etária, de gênero e de sexualidade. 

 

O Caderno Metodológico do projeto “Andanças do Patrimônio” prevê, também, um conjunto de estratégias para os organizadores das oficinas promoverem a mobilização social e incluem divulgação nos sites oficiais, meios de comunicação, imprensa, envio de convite às organizações e movimentos sociais, articulações com os interessados em apoiar as oficinas, e campanhas publicitárias de sensibilização. 

 

A participação da comunidade na seleção, proteção e promoção do patrimônio cultural é um imperativo constitucional que deve ser assegurado pelo poder público, sendo um direito da comunidade, mas também um dever que se projeta inclusive para com as futuras gerações.  As Convenções da Unesco do Patrimônio Material e Imaterial e suas diretrizes operativas destacam a essencialidade da participação da comunidade no processo de patrimonialização e, em especial, para a sua inclusão em Listas de patrimônio da humanidade. Contudo, a limitação da mobilização social e comunitária revela-se como uma realidade constante nos diferentes domínios da vida social, e no caso do patrimônio cultural ela parece ser ainda mais difícil de ser superada.   

 

Nos Relatórios das Oficinas das “Andanças”, já disponíveis no site do IPHAN [2], os participantes apontam, direta e indiretamente, como desafios a serem enfrentados pelo Sistema Nacional do Patrimônio Cultural: a mobilização e a articulação da comunidade, dos demais segmentos sociais e até mesmo do próprio poder público — em especial os entes municipais, que muitas vezes não possuem estrutura administrativa voltada ao patrimônio cultural. 

 

Onde queremos chegar? Está claro pelos ditames normativos e pelas diretrizes metodológicas do projeto “Andanças do Patrimônio”: queremos construir um Sistema Nacional do Patrimônio Cultural plural, participativo, inclusivo, democrático. Contudo, a realidade faz as expectativas reduzirem drasticamente, especialmente quando se depara com as dificuldades concretas da execução de um projeto como este, num país de extensão continental como o Brasil, e com fragilidades em termos de pessoal e de infraestrutura.   

 

Além disso, é preciso refletir sobre as estratégias de mobilização da comunidade, que não podem ser episódicas, mas sim periódicas. Só assim será possível construir laços duradouros, baseados na confiança, para que as comunidades se sintam parte dos processos de patrimonialização — desde o planejamento das políticas públicas até os atos formais de reconhecimento, como o registro, o tombamento e o desenho dos mecanismos de salvaguarda. 

 

A construção desses vínculos participativos precisa estar alicerçada no protagonismo das comunidades e no estímulo para que elas liderem os diálogos, a partir de suas necessidades, visões e vivências sobre o patrimônio cultural. Isso significa inverter a lógica que ainda prevalece na relação entre poder público e comunidade — em que aquele se coloca como detentor do conhecimento técnico e da linguagem burocrática, enquanto esta deve se submeter a tal lógica estatal para acessar as políticas patrimoniais.   


Assim, é preciso percorrer o caminho inverso, adotando estratégias bottom-up (da base ao topo, isto é, da comunidade ao Estado), para garantir a efetiva participação social. Envolver a comunidade na construção das estratégias e da agenda política do patrimônio cultural significa colaborar com a própria vida coletiva, fortalecendo os vínculos entre seus membros e seus valores culturais.


É necessário, portanto, estimular a autonomia comunitária e o protagonismo social — o que exige tempo e enfrenta as limitações das instituições culturais, já no limite de sua capacidade de ação.    


Notas:      


[1] IPHAN. Andanças do patrimônio. Caderno metodológico. 2025. Disponível em: https://www.gov.br/iphan/pt-br/assuntos/andancas/CadernoAndanasdoPatrimniofinal22_041.pdf acesso em 23 ago. 2025  


[2] IPHAN. Relatórios das oficinas. Andanças do Patrimônio. 2025, disponível em: https://www.gov.br/iphan/pt-br/assuntos/andancas/oficinas-presenciais Acesso em 26 ago. 2025        

 

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