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A isenção de IPTU para bens reconhecidos como patrimônio cultural



Divulgação / Prefeitura do Rio

Todo início do ano, chega nas residências brasileiras o carnê de Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) para ser quitado. As guias de 2023, se já não foram recebidas, devem estar a caminho; isso é certo. Mas você sabia que existem locais que concedem isenção do IPTU para imóveis que são considerados patrimônio cultural?


O IPTU é um tributo municipal cobrado anualmente de proprietários de imóveis situados em área urbana; pode ser uma casa, um edifício ou mesmo um estabelecimento comercial. O valor do imposto é calculado a partir do chamado “valor venal do imóvel”, que é estabelecido pelo poder público com base numa estimativa que considera diversos fatores, tais como o valor de compra-venda, a localização ou o tempo de existência do imóvel.


Mas nem todo proprietário tem que pagá-lo. Muitas cidades possuem normas que concedem isenção desse imposto para imóveis de relevante valor cultural ou de interesse histórico e cultural. A terminologia pode variar, de localidade para localidade, mas o que se depreende dessas leis municipais de incentivo é que o IPTU não será cobrado daqueles bens que sejam de interesse público em razão do seu viés histórico-artístico e cultural e que, além disso, estejam em bom estado de conservação.


Mas como comprovar esse viés histórico-artístico-cultural do imóvel? Para o Poder Público local esse status se constitui, na maioria das vezes, através do instituto do tombamento, mecanismo que seleciona alguns bens que integram o patrimônio cultural e lhes garante uma tutela jurídica específica.


Mas vale dizer que o tombamento não é a única ferramenta disponível para auferir, do ponto de vista oficial, esse relevante valor atribuído ao bem. Outros instrumentos de preservação do patrimônio cultural ou mesmo urbanísticos podem fazê-lo. Porém, sem dúvida, o tombamento é o mais comum e utilizado há décadas.


O tombamento foi criado, no Brasil, no final da década de 30 do século passado num contexto político e jurídico conturbado. Ele foi concebido no Estado Novo para reconhecer e, ao mesmo tempo, conservar bens móveis e imóveis que fossem integrantes do chamado patrimônio histórico e artístico nacional.


De lá para cá, avançou-se muito. O próprio conceito de patrimônio evoluiu, incorporando sua dimensão imaterial, sendo mais correto utilizar o termo patrimônio cultural, seguindo a linha do art. 216 da Constituição Federal de 1988 [1]. O tombamento, que está presente também em sistemas estaduais e municipais, continua demonstrando a sua força jurídica, dividindo o protagonismo político com outros instrumentos de acautelamento e preservação, a exemplo do registro de bens de natureza imaterial.


O tombamento – seja ele federal, estadual ou municipal – pode ser aplicado tanto em bens públicos, quanto em bens privados, limitando-se, neste último caso, ao exercício do direito de propriedade. Quando isso acontece em imóveis particulares, inicia-se um certo entrave na gestão desses bens que são, vale lembrar, de interesse público.


É que o tombamento gera uma série de efeitos jurídicos que devem ser suportados pelo proprietário privado. O principal deles é a conservação da coisa tombada. Essa obrigação decorrente do tombamento, infelizmente, acaba onerando o dono da casa, do prédio ou do estabelecimento comercial, considerando que a prática da conservação de bens tombados exige recursos humanos especializados e técnicas específicas de restauro que são complexas e caras.


Assim, no intuito de mitigar esse ônus, a isenção de IPTU pode ser considerada uma excelente ferramenta de incentivo à conservação do bem cultural. Não chega a ser compensatória – certamente não – mas é um bônus que estimula os proprietários a estar em conformidade com os parâmetros definidos pelos órgãos de preservação do patrimônio cultural.


Do ponto de vista do gestor público do patrimônio cultural, esse mecanismo é bastante eficiente, pois inverte o sentido da fiscalização do bem tombado, ou seja, os proprietários interessados na isenção é que acabam procurando os órgãos técnicos especializados para atestarem o bom estado de conservação, no intuito de obter o “nada a opor” com vistas à concessão do benefício.


Essa política fiscal, portanto, deve ser mantida e expandida, uma vez que tem um forte rebatimento na política preservacionista local, estimulando a colaboração da comunidade na promoção e proteção do patrimônio cultural brasileiro, conforme descrito no §1º do art. 216 da Constituição Federal de 1988, especialmente daqueles responsáveis diretos pela gestão do bem cultural, isto é, os proprietários dos imóveis que fazem jus à isenção do IPTU.

* Mário Pragmácio, Doutor em Teoria do Estado e Direito Constitucional (PUC-Rio), Professor do Departamento de Artes e da Pós-graduação em Cultura e Territorialidades da UFF e Conselheiro do Instituto Brasileiro de Direitos Culturais (IBDCult)

Nota

[1] Disponível em : http://portal.iphan.gov.br/uploads/legislacao/constituicao_federal_art_216.pdf

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