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O que há de novo na velha Rouanet? 

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Mário Pragmácio é advogado, professor de Legislação de Incentivo à Cultura do Departamento de Arte da Universidade Federal Fluminense 

 

Cecilia Rabelo é advogada, ex-presidente do Instituto Brasileiro de Direitos Culturais (IBDCult), mestre em Direito Constitucional, especialista em Direito Público e em Gestão de Políticas Culturais   


“O mais longevo programa de incentivo cultural do Brasil”. É assim que o recém-criado site da Rouanet dá as boas-vindas ao internauta interessado em saber mais sobre o Programa Nacional de Apoio à Cultura – PRONAC – nome técnico, mas pouco conhecido, da Rouanet.


A nova marca do Programa traz, sem vergonha e com destaque, o sobrenome de Sérgio Paulo, que, não faz muito tempo, era utilizado para ofender quem laborava no setor cultural; não importava se o ofendido fazia uso ou não de financiamento público, se o agressor entendia ou ignorava os detalhes dessa lei. “Rouanet” era sinônimo das piores condutas possíveis, geralmente utilizado por quem nunca sequer parou para entender como funciona uma das principais normas de fomento à cultura do país.


Depois de 35 anos, atravessando instabilidades políticas, sobretudo três extinções do Ministério da Cultura (Collor, Temer e Bolsonaro), a Lei Rouanet, em si, mudou muito pouco. Mas a operação desta Lei, no entanto, passa por transformações profundas. Não exatamente o texto da Lei de 1991, mas, na verdade, a forma como o atual governo vem experimentando diferentes arranjos e testando modelos de incentivo, a partir de normas infralegais específicas (como a IN dos Territórios Criativos e a IN dos Endowments) ou através dos chamados programas especiais, que permitem sair da lógica de projetos (escolhidos pelos departamentos de marketing das empresas) que impera até os dias de hoje.


O primeiro aspecto que aponta para um desejo de mudança são os Programas Especiais, a exemplo da Rouanet da Juventude, Rouanet Norte, Rouanet nas Favelas e Rouanet Nordeste. O conceito que torna esses programas “especiais” é que haja oportunidade de incentivar projetos daqueles grupos que historicamente são alijados dos processos de captação de recursos do PRONAC.


O Ministério da Cultura evita utilizar o termo “desconcentração”, mas invoca a retórica da “nacionalização dos recursos” – que não difere muito. Independentemente do discurso invocado, o alvo é a já bastante conhecida concentração de recursos no eixo Rio-São Paulo, não dá para esconder. Um exemplo claro desse objetivo é que o Programa Rouanet nas Favelas, pasmem, não permitiu que os projetos das comunidades do Rio de Janeiro pudessem concorrer aos recursos públicos abatidos do Imposto de Renda da Vale S/A.


Pesquisa recente, realizada pelo Observatório Ibira 30 e pela Universidade Federal do ABC, identificou que, entre 2014 e 2023, o distrito de Pinheiros, na Zona Oeste de São Paulo, concentrou mais recursos via Lei Rouanet do que metade da capital paulista, totalizando R$ 5,98 bilhões. A concentração no eixo Rio-São Paulo é um problema histórico do mecanismo de incentivo fiscal, que reflete a desigualdade econômica e social do país.


Vale dizer que uma das grandes vantagens desses programas especiais é que o patrocinador já vem “embarcado”, ou seja, os proponentes não precisam se preocupar com a captação de recursos, pois eles já são fixados pelo Ministério da Cultura. Isso ocorre por conta de uma intensa articulação do MinC com certos patrocinadores, colocando as rédeas do Poder Público sobre a lógica neoliberal da Rouanet.


Mas certamente isso não é radical nem perene, pois é fruto das atuais negociações da atual gestão do MinC com o empresariado nacional. Não há perspectiva de continuidade em uma mudança de governo, por exemplo, já que tais programas não estão previstos na Lei Rouanet em si, mas em normas infralegais que a operacionalizam. São, de fato, novas possibilidades de incentivo fiscal à cultura para uma velha Rouanet.



 




 

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